Os nomes de Deus e em particular de seu
representante
chamado Jesus ou Cristo, segundo textos e bocas,
têm sido usados, gastos e largados
à margem do rio das vidas
como conchas vazias de um molusco.
E no entanto, ao tocar estes nomes sagrados
e sangrados, pétalas feridas,
saldos dos oceanos do amor e do medo,
algo ainda permanece: um lábio de ágata,
a marca irisada que ainda treme na luz.
Enquanto se usavam os nomes de Deus
por melhores e por piores, por limpos e por
sujos
por brancos e negros, por ensanguentados
assassinos
e pelas vítimas douradas que arderam no napalm,
enquanto Nixon com mãos
de Caim bendizia seus condenados à morte,
enquanto menos e menores pegadas divinas
foram encontradas na praia,
os homens começaram a estudar as cores,
o porvir do mel, o signo do urânio,
buscaram com desconfiança e esperança as
possibilidades
de matar-se ou de não se matar, de organizar-se
em fileiras,
de ir além, de ser ilimitável sem repouso.
O s que cruzamos estas idades com gosto de sangue,
fumaça de escombros e de cinza morta,
e não fomos capazes de perder nosso olhar,
e muitas vezes nos detivemos nos nomes de Deus,
e os levantamos com ternura porque nos
recordavam
os antecessores, os primeiros,os que interrogaram,
os que encontraram um hino que os uniu na
desdita
e agora vendo os fragmentos vazios onde habitou
aquele nome
sentimos estas suaves substâncias
gastas, maltratadas pela bondade e pela maldade.
Pablo Neruda
In Jardim de Inverno
tela El Greco
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